Low é pesquisador da Universidade
Stanford e do MIT (Massachusetts Institute of Technology), ambos nos Estados
Unidos. Ele e mais 25 pesquisadores entendem que as estruturas cerebrais que
produzem a consciência em humanos também existem nos animais. "As áreas do
cérebro que nos distinguem de outros animais não são as que produzem a
consciência", diz Low, que concedeu a seguinte entrevista ao site de VEJA:
Estudos sobre o comportamento animal já
afirmam que vários animais possuem certo grau de consciência. O que a
neurociência diz a respeito?
Descobrimos que as estruturas que nos
distinguem de outros animais, como o córtex cerebral, não são responsáveis pela
manifestação da consciência. Resumidamente, se o restante do cérebro é
responsável pela consciência e essas estruturas são semelhantes entre seres
humanos e outros animais, como mamíferos e pássaros, concluímos que esses
animais também possuem consciência.
Quais animais têm consciência?
Sabemos que todos os mamíferos, todos
os pássaros e muitas outras criaturas, como o polvo, possuem as estruturas
nervosas que produzem a consciência. Isso quer dizer que esses animais sofrem.
É uma verdade inconveniente: sempre foi fácil afirmar que animais não têm
consciência. Agora, temos um grupo de neurocientistas respeitados que estudam o
fenômeno da consciência, o comportamento dos animais, a rede neural, a anatomia
e a genética do cérebro. Não é mais possível dizer que não sabíamos.
É possível medir a similaridade entre a consciência de mamíferos e
pássaros e a dos seres humanos?
Isso foi deixado em aberto pelo
manifesto. Não temos uma métrica, dada a natureza da nossa abordagem. Sabemos
que há tipos diferentes de consciência. Podemos dizer, contudo, que a
habilidade de sentir dor e prazer em mamíferos e seres humanos é muito
semelhante.
Que tipo de comportamento animal dá suporte à ideia de que eles
têm consciência?
Quando um cachorro está com medo,
sentindo dor, ou feliz em ver seu dono, são ativadas em seu cérebro estruturas
semelhantes às que são ativadas em humanos quando demonstramos medo, dor e
prazer. Um comportamento muito importante é o autorreconhecimento no espelho.
Dentre os animais que conseguem fazer isso, além dos seres humanos, estão os
golfinhos, chimpanzés, bonobos, cães e uma espécie de pássaro chamada
pica-pica.
Quais benefícios poderiam surgir a partir do entendimento da
consciência em animais?
Há um pouco de ironia nisso. Gastamos
muito dinheiro tentando encontrar vida inteligente fora do planeta enquanto
estamos cercados de inteligência consciente aqui no planeta. Se considerarmos
que um polvo — que tem 500 milhões de neurônios (os humanos tem 100 bilhões) —
consegue produzir consciência, estamos muito mais próximos de produzir uma
consciência sintética do que pensávamos. É muito mais fácil produzir um modelo
com 500 milhões de neurônios do que 100 bilhões. Ou seja, fazer esses modelos
sintéticos poderá ser mais fácil agora.
Qual é a ambição do manifesto? Os neurocientistas se tornaram
militantes do movimento sobre o direito dos animais?
É uma questão delicada. Nosso papel
como cientistas não é dizer o que a sociedade deve fazer, mas tornar público o
que enxergamos. A sociedade agora terá uma discussão sobre o que está
acontecendo e poderá decidir formular novas leis, realizar mais pesquisas para
entender a consciência dos animais ou protegê-los de alguma forma. Nosso papel
é reportar os dados.
As conclusões do manifesto tiveram algum impacto sobre o seu
comportamento?
Acho que vou virar vegetariano. É
impossível não se sensibilizar com essa nova percepção sobre os animais, em
especial sobre sua experiência do sofrimento. Será difícil, adoro queijo.
O que pode mudar com o impacto dessa descoberta?
Os dados são perturbadores, mas muito
importantes. No longo prazo, penso que a sociedade dependerá menos dos animais.
Será melhor para todos. Deixe-me dar um exemplo. O mundo gasta 20 bilhões de
dólares por ano matando 100 milhões de vertebrados em pesquisas médicas. A
probabilidade de um remédio advindo desses estudos ser testado em humanos
(apenas teste, pode ser que nem funcione) é de 6%. É uma péssima contabilidade.
Um primeiro passo é desenvolver abordagens não invasivas. Não acho ser
necessário tirar vidas para estudar a vida. Penso que precisamos apelar para
nossa própria engenhosidade e desenvolver melhores tecnologias para respeitar a
vida dos animais. Temos que colocar a tecnologia em uma posição em que ela
serve nossos ideais, em vez de competir com eles.
FONTE: REVISTA VEJA
Nenhum comentário:
Postar um comentário