CONAMA aprova Resolução que permite a posse, pela população, de animais
silvestres de origem ilegal
Por Dener Giovanini*
O Conselho
Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) aprovou em sua última reunião, realizada no
dia 22 de maio, uma Resolução que regulamenta a posse de animais silvestres que
tenham sido apreendidos pelos órgãos de controle e fiscalização ambiental. De
acordo com o documento – que nos próximos dias deverá ser publicado no Diário
Oficial, após a análise final do MMA – o cidadão que tiver animais de origem
ilegal (oriundos do tráfico) poderão permanecer com eles após receberem, por
parte do órgão fiscalizador, um Termo de Guarda de Animal Silvestre (TGAS) ou
um Termo de Depósito de Animal Silvestre (TDAS). O mesmo se aplica a quem
decidir, voluntariamente, procurar a fiscalização ambiental para “regularizar”
a sua situação.
A mesma
Resolução impõe algumas restrições. Não será permitida a emissão de TGAS e TDAS
para espécies em risco de extinção e ainda limita a posse a dois animais por
pessoa. Aqui caberia uma longa e profunda discussão acerca dessa Resolução. A
mesma permite espaço para debates sobre a legalidade, validade e até mesmo
sobre a ética dessa iniciativa.
Porém, o fato
mais importante dessa questão transcende tudo isso. Essa resolução do CONAMA é
um sinal claro da ineficiência do Brasil para gerir sua fauna silvestre.
Independente dos argumentos contra e a favor dessa norma – e são muitos – o
fato é que existe algo de muito errado em nossa política nacional de fauna.
A principal
alegação para a criação dessa Resolução, está no fato de que os órgãos de
fiscalização ambiental não dispõem mais de espaço ou recursos para abrigar o
imenso número de animais apreendidos do comércio ilegal. Os Centros de Triagem
(CETAS) do IBAMA e das demais instituições ambientais estão lotados e
enfrentam, em sua maioria, graves problemas de manutenção. Também alegam os
gestores públicos que se deve fazer uma distinção entre quem possui um pequeno
número de animais ilegais do grande traficante da fauna silvestre.
Os que são
contra essa medida alegam que “legalizar” um animal de origem ilícita seria
estimular o tráfico. Seria uma forma de “premiar” quem cometeu um crime
ambiental. Numa visão objetiva: se fosse um carro roubado, ao invés de um
animal, o DETRAN teria a opção de deixar o produto do roubo em posse do
meliante, alegando que seus depósitos estão lotados. Ou melhor, o ladrão de
carros poderia, seguindo a lógica da resolução, ficar com até dois veículos
oriundos do seu ato criminal.
A Resolução do
CONAMA não exclui as sanções civis e criminais do ato. Mesmo permanecendo em
posse do infrator, o mesmo responderá por seu delito ambiental. Em resumo, será
multado e poderá ser condenado. Pela atual legislação ambiental, isso significa
que a multa nunca será paga e em nada prejudicará sua vida financeira e, em caso de condenação, ele será
obrigado a gastar uns poucos reais com a compra de algumas cestas básicas para
serem doadas a alguma instituição de caridade.
Como dito
anteriormente, essa Resolução é apenas um sintoma de uma grave doença que se
alastra em nosso país. Falta-nos uma política ambiental séria e eficiente.
Tratamos apenas dos sintomas e nos esquecemos de buscar e tratar a causa.
Ameniza-se o desconforto com soluções paliativas e de pouco resultado prático.
No caso do tráfico de animais silvestres, qualquer coisa que se faça após um
animal ter sido retirado da natureza se enquadra nesse prognóstico.
É mais que
sabido que os CETAS não são uma solução. No fim acabam se tornando apenas mais
um depósito de bichos. A reintrodução da fauna apreendida ainda é uma grande
utopia. É um processo caro e, na maioria das vezes, se pode aplicar a algumas
poucas espécies. E no fim, trata-se apenas de repetir a prática de se enxugar
gelo. Retiram-se milhões de espécies da natureza e devolve-se meia dúzia. Uma
conta simples que qualquer contador definiria como prejuízo total.
O fato é que
precisamos de ferramentas mais eficazes para tratar essa questão.
Conscientização ambiental é a mais poderosa delas. A sociedade brasileira
precisa estar ciente de que não pode – e não deve – sob nenhum argumento,
comprar um animal de origem ilegal.
Ela precisa ser informada dos riscos, como
a transmissão de doenças para a sua família, e sobre os impactos destrutivos
que essa atividade ilegal causa ao meio ambiente. Uma legislação objetiva e que
possua uma aplicabilidade real também se faz necessária. Não podemos mais
dispor de instrumentos legais fracos e “para inglês ver”. Não podemos mais
fechar os olhos para uma realidade gritante: estamos perdendo a guerra na
conservação dos nossos recursos naturais.
* Ambientalista e documentarista
cinematográfico. É membro do Conselho Global contra o Comércio Ilegal Mundial,
mantido pelo G20 e ONU. Produz séries e documentários para cinema e TV www.denergiovanini.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário