sexta-feira, fevereiro 24

TEMA PARA DEBATE:

 o cão reflete o dono
Por Cauê Vieira*

A tragédia que ocorreu com o menino Gustavo, de cinco anos, morto por um cão em Capão da Canoa, suscita, mais uma vez, inúmeras reflexões sobre a posse de cães ditos agressivos. Obviamente, diante de um fato como esse, a primeira reação da grande maioria das pessoas, desvinculadas da causa animal, é a de crer que os cães pitbull e afins são máquinas programadas para matar, extremamente ferozes e incontroláveis.

Apesar de fazer parte do senso comum, essa ideia não é verdadeira, não em absoluto. O cão, de qualquer raça que ele seja, é um reflexo direto do seu dono, do seu tutor. Sim, tutor, pois, tal como uma criança, ele precisa de atenção e cuidados ininterruptos, seja ele um poodle ou um dobermann.

Por isso, o ponto central do debate que deve ser feito em decorrência de mais esse dramático incidente é o da posse responsável de animais domésticos, e não sobre extermínio de raça“A”ou raça“B”, ou ainda sobre culpados nessa lamentável história.

Ao adquirir, seja pela compra seja pela adoção, qualquer animal, o ser humano deve levar em conta as suas reais capacidades. Por suas, digo a do humano. Explico: um animal necessita de muito mais do que comida e um lugar para viver. Da mesma forma, necessita muito mais do que simplesmente carinho e afeto. Um animal precisa, nessa exata ordem, de disciplina, exercício e afeto.

Disciplina para ser educado a obedecer aos limites impostos por seu líder. Caso contrário, ele assume, a contragosto, a liderança em uma casa, fato de extrema complexidade em sua reversão.

Exercício para não ficar com energia acumulada, que pode explodir a qualquer momento, seja em um ataque a pessoas, seja em um ataque a objetos. Costuma-se dizer que “cabeça vazia é a oficina do Diabo” nos homens. Pois bem, com os animais não é diferente. O responsável por ele deve proporcionar exercícios diários, tanto físicos quanto mentais.

E por fim, afeto, haja vista que a criação de um vínculo de liderança rígida sem afetividade não oferece o mesmo resultado do que em casos em que o laço entre homem e animal atinge a mais pura, verdadeira e gratuita cumplicidade e respeito mútuo.
Há de se garantir ainda acompanhamento médico veterinário, adestramento inicial e de manutenção, alimentação adequada, castração para evitar crias indesejadas, chipagem para identificação do animal, dentre outras. Providências a serem tomadas por qualquer ser humano para que possamos ter o que cognominamos posse responsável.

Se a pessoa entende essas regras básicas, crê ter condições de proporcionar ao animal tal tratamento, devesse passar para a próxima etapa, igualmente fundamental: conhecer o que se está levando para casa. Qual o objetivo de ter um animal? Companhia? Segurança? Diversão? De posse de tais respostas, deve-se buscar ajuda profissional para encontrar a melhor raça e espécie que nelas se encaixe.

Isso posto, é possível afiançar que um animal tratado desde o início com tais cuidados dificilmente será notícia sob o aspecto negativo, seja ele um pequeno cão de companhia ou um dogo argentino de 80 quilos.

O homem criou praticamente todas as raças que conhecemos a partir dos lobos. Desincumbir o homem agora de lidar com elas é, no mínimo, uma covardia atroz e um atestado de imbecilidade que não se pode admitir.

Certamente teríamos que ter mais regramentos para a posse de animais ditos agressivos, talvez até avançando para uma habilitação para o proprietário. Lembro, contudo, que leis responsabilizando os donos existem às pencas. Fiscalização existe na medida do possível, sendo necessário, sim, ampliá-la. O que não temos, então, é a necessária educação da sociedade em relação à posse responsável de animais. É esse o caminho da necessária evolução da nossa sociedade.

*Advogado
Publicado no jornal ZERO HORA, de Porto Alegre

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